
A euforia tomou conta dos adeptos do
Benfica, o que, convenhamos, não é para menos. Após dez temporadas de jejum no que toca à conquista do campeonato nacional, os "encarnados" foram campeões e, no regresso à Liga milionária, a equipa chegou aos quartos-de-final afastando, de forma brilhante, nomes como o Manchester United e o Liverpool. Poder-se-ia dizer que estamos perante um renascido
Benfica, como dos bons velhos tempos, mas essa é uma ideia, a meu ver, precipitada.
Numa análise fria à época da equipa de Koeman, a ideia que nos salta é que este
Benfica vive da sua defesa e nada mais. Mas perguntam-me vocês... mas não é na defesa que se ganham campeonatos e no ataque que se ganham jogos? De uma forma geral sim, embora de rigor esta frase tenha muito pouco. Vamos por partes: uma equipa que só sabe atacar, corre o risco de fazer exibições e resultados deslumbrantes, sendo que no final das contas, a irregularidade acabará, quase invariavelmente, por cobrar o seu preço. Não é difícil constatá-lo nas muitas equipas de forte cunho defensivo, de futebol pouco apelativo, que ganham títulos consecutivamente. As defesas evitam os tentos adversários e se na "retranca" não se marcam muitos golos, a verdade é que um chega para somar três pontos.
O caso do
Benfica é mais complicado. O bom (ou mesmo excelente)
Benfica da presente temporada assenta a sua força na defesa. Nem a insegurança de Moretto consegue colocar esta realidade em causa. As escolhas de Ronald Koeman revelam muito da sua filosofia no sector defensivo. A insistência em Moretto, inferior a Quim em todos os capítulos, é sustentada apenas e só no 1,95m do brasileiro. No eixo da defesa, Luisão está de pedra e cal (nem é preciso dizer porquê) e Anderson é, para além de um central de eleição, bem mais alto que Ricardo Rocha... que por seu turno é mais alto que Léo. Daí que Koeman, a dada altura, tenha deixado cair Léo e também Nélson, apostando em quatro centrais (!), dois deles nas laterais. Há quem lhe chame medo, outros realismo. Eu não sei o que é, mas Léo só entrou de novo na equipa porque era difícil ao holandês continuar a justificar a não utilização de um jogador da sua qualidade. Nélson, por seu turno, teve uma quebra de forma, e como não tem a experiência do brasileiro, Koeman aproveitou e apostou em Alcides, também ele bastante alto (com bons resultados, diga-se).
Só que há um problema nesta filosofia de Koeman. O que o treinador tem de bom a montar uma defesa, falta-lhe na organização de meio-campo. Não concordo quando ouço ou leio comentadores falar na coesão do meio-campo do
Benfica. É, em dúvida, lutador e pressionante, o que o faz ganhar muitas bolas na raça, mas os seus elementos jogam a "milhas" de distância uns dos outros, deixando que, facilmente, uma equipa mais bem organizada empurre Petit, Beto e Cia para junto do seu sector defensivo, onde lá está, os quatro do costume têm resolvido, mais jogo, menos jogo. Depois, o mesmo acontece com os processos ofensivos. Salvo raras excepções, o
Benfica não consegue controlar os seus adversários em termos de posse de boa e esmagador domínio ofensivo, excepto em situações de desespero. Veja-se, por exemplo, o que o
Sporting conseguiu fazer na Luz, explorando essas debilidades "encarnadas" a meio-campo, ou o que a Académica fez também, embora com um resultado final enganador.
Posto isto, pergunto... é possível uma equipa sobreviver apenas da sua defesa? Não, não é. A prova está na Liga portuguesa. Ao recorrer apenas à sua defesa, sem procurar um domínio do meio-campo, o
Benfica tornou-se em poucos meses numa formação de contra-ataque puro. É isso que o
Benfica é! Em Portugal, contra equipas que defendem mais do que atacam, o
Benfica tem muitas dificuldades em jogar em ataque continuado e em marcar golos. Quando o faz, fragiliza a sua defesa, faz subir erradamente os dois laterais e depois é o que se vê... sete pontos de atraso para o
FC Porto.
Na Europa é diferente. O
Benfica pode (e deve, face ao poderio das outras equipas) refugiar-se na sua defensiva, onde Luisão e Cia têm estado fantásticos (ao contrário do que se viu em Portugal em alguns jogos), e aproveitar para fazer o que tanto gosta, jogar no contra-ataque com os seus velozes jogadores. Não raras vezes Koeman utilizou três extremos ao mesmo tempo! Tendo um relvado apenas um lado direito e um lado esquerdo, algo fica a sobrar.
O
Benfica não vai ganhar nada por isso mesmo. Em Portugal tem de atacar, e quando o faz não é da melhor forma. Campeonato e Taça serão, mais cedo ou mais tarde, uma miragem (embora a Taça seja uma competição especial). Na Europa o
Benfica sente-se como peixe na água. Mas será o suficiente? Penso que contra Ronaldinhos, Eto'o e Messi, é preciso algo mais.
P.S.: Juro que escrevi isto antes do jogo com o Guimarães!